Especial: Saiba mais sobre o assustador mito do “Slender Man”

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De todas as falácias grotescas, creepypastas perturbadoras e mitos sobrenaturais gerados pela internet, é o do Slender Man aquele que mais me interessa. O homem delgado, cheio de garbo e elegância, sem rosto e portador de tentáculos invejáveis até para Cthulhu e Dr. Octopus (certo, talvez não para Cthulhu, sabe como é), é protagonista de um sem fim de obras nas mais diversas mídias. 

 

Slender Man

 

Surgido em 2009 num thread do sensacional fórum Something Awful (mesmo lugar que nos trouxe a apoteótica luta de boxe entre um usuário despudorado e Uwe Boll, o terrível), comparo a gênese de Slender a de Frankenstein, de Mary Shelley: uma noite de delírios, disputas e provocações. Claro, não há Lord Byron como anfitrião, mas imagino que as substâncias ilícitas presentes possam estabelecer tal paralelismo. Conjecturas à parte, e celebrando o re-re-relançamento de Slender: The Arrival (sim, primeiramente PC, em 2013, via crowdfunding, Xbox 360 e PS3 em 2014, e agora na geração atual de consoles), separei algumas das formas mais legais (?) de explorar as capacidades do monstro que não existe – mas tem muita gente que jura já tê-lo visto! (Leiam isso, é fantástico!)

Mas, antes de mais anda, qual é a desse personagem? Qual é seu real propósito? Por que o magrelo de paletó se tornou tão popular e populesco? Não tenho e nem faço muita questão de ter qualquer reposta a estas perguntas, pois sou apenas alguém que consome enlouquecidamente todas estas bobagens, como um viciado em queijo cheddar de spray ou colecionadores de uvas-passas. É bem neste meio onde me sinto acolhido.

 

Slender Man

 

Absurdos são os caminhos que tais linhas parecem seguir, mas a loucura vem despercebida. Há louco são de seu estado? Para uma pessoa alheia aquilo que temos por “realidade”, somos nós os enlouquecidos? Apenas Zé do Caixão teria a resposta…

Muito provavelmente você deve ter ouvido falar de Slender Man através de Slender: The Eight Pages, freemium que aterrorizou as noites de muita gente – inclusive a de meu irmão, e me sinto péssimo por tê-lo feito passar por isso. O jogo foi como fogo de palha, se espalhando ensandecidamente por todos aqueles que gastam as madrugadas nos cantos mais recônditos e inóspitos do mundo virtual. Nada relacionado a conteúdo surgido em fóruns de suicídio ou algo do tipo, mas algo amplamente divulgado, com Youtubers gritando seus tratos respiratórios para fora enquanto da jogatina. Aliás, tal método patético de angariar seguidores parece estar ficando para trás – as visualizações de Five Nights at Freddy’s 3 não chegam nem perto do original. Mera questão de tempo para tal? Péssimo exemplo? Precisaria depositar parágrafos e mais parágrafos dissecando tal proeza minimalista de horror? Talvez.

 

Slender Man

 

Eight Pages é, indiscutível e absurdamente, eficaz: você pode baixar agora – qualquer computador vagabundo é capaz de rodar – apagar as luzes, colocar fones de ouvido e tentar chegar ao final. Impossível não imergir. Premissa das mais simples: caminhando por uma floresta, munido apenas de lanterna e numa perspectiva em primeira pessoa, temos que encontrar as famigeradas oito páginas que dão nome ao jogo. A cada página encontrada, coisas começam a acontecer, desde batidas metálicas intensificadas, a presença sinistra de Slender, mais e mais viva. Porque a criatura se faz apenas de sua presença, sequer se movimenta, apenas está lá, estática, e alguns segundos de contato visual direto são suficientes para levar à loucura. Mais Lovecraft, impossível. O sucesso de Eight Pages levou a The Arrival, disponível na lojinha virtual de seu console de preferência – até uma versão de Wii U fora anunciada, mas ainda consta como TBA (pobre Nintendo).
Partindo do mais evidente e submergindo para águas mais profundas, há Pascal Laugier. O genial diretor de cinema francês, responsável por uma das mais extremas obras da memória recente da sétima arte, Martyrs, também tem sua parcela de culpa na popularização do mito Slender. The Tall Man, de 2012, e numa patética localização pt-br para O Homem das Sombras (por quê, sério? O Homem Alto não seria assim tão assustador? Criminosos localizadores), estrela Jessica Biel na maior humanização de tal lenda macabra. Crianças desaparecidas de cidades interioranas dos Estados Unidos. A mesma figura assustadora relatada nas proximidades sempre quando há o ocorrido. Contar mais seria estragar o espetacular desfecho, capaz de apagar até algumas falhas bobas encontradas aqui e ali – é a ingressão de Laugier em Hollywood, aquele lugar onde todos os diretores brilhantes do mundo são convidados para morrer. Ademais, recomendo.

Para finalizar, minha forma favorita de desenvolver Slender. Inveja branca, no caso, pois gostaria de explorar a temática desta mesma forma, com curta metragem. Marble Hornets é uma série de youtube com cerca de 92 episódios, iniciados em 2009 e com finalização um tanto quanto conturbada. Dizem que seus criadores tiveram atritos durante a produção, o que fica claro por conta da irregularidade da qualidade de vários dos episódios. Alguns longos e tediosos, outros curtíssimos e ultra impactantes, Marble Hornets é interessante quando consegue se fazer passar por algo extremamente amador, pois toda e qualquer tentativa de requinte técnico e pedantismos dramáticos degringolam para algo difícil de engolir. Recomendo assistir a um par por noite, antes de dormir. Algum efeito há de surgir.

 

Slender Man

 

A lenda de Slender diz respeito à loucura advinda da obsessão. Apesar do teor macabro de sua presença entre crianças, é esta nuance obsessiva pela qual tenho mais interesse. Vício ininteligível por algo abstrato, síndrome do pânico, medo de multidões e sensação constante de perseguição – patologias extremamente comuns entre habitantes de grandes metrópoles, engolidos por seus trabalhos e rotinas excruciantes. Slender, a meu ver, é a metamorfização e exteriorização de tais medos e anseios na forma do monstro humanoide, pulsante e pungente a uma existência dominadora, onde somo submissos a nossas obrigações e vivemos em função de prestar algum serviço a alguém ou a algo.

Imagino que este texto que você acabou de ler não tenha sido tão macabro e assustador quando antecipado – e, por isso, peço perdão – mas o medo real está na capacidade de conceber tais ficções, todas, sem exceção, exercícios de recalque. Há um Slender atrás de você agora, e talvez você precise tomar remédios para fazê-lo desaparecer. Ou talvez você o abrace e se torne um com o monstro. Eu, sinceramente, prefiro a segunda opção.

 


 

Sobre o autor: Makson Lima é produtor e já trabalhou na PlayTV, onde era responsável pelos programas de cinema, Moviola e CinePlay, além de colaborar eventualmente com análises de filmes e jogos. Talvez você já tenha visto sua cara anêmica participando do programa Go!Game. De umas semanas para cá, tem escrito bobagens em seu Tumblr, e faz do twitter (@maksonlima) um exercício de catarse para com as escaras da humanidade. Tem uma admiração um tanto quanto doentia por Silent Hill, Siren e Shin Megami Tensei, além de considerar Chan-Wook Park e Takashi Miike os maiores diretores de cinema da atualidade. Procura experimentar absolutamente todas as desgraceiras do entretenimento eletrônico que surgem por aí (e do cinema também, e das HQs, e da literatura), e odeia falar sobre si mesmo na terceira pessoa.

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